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O Cemap de Vito Letizia

Dainis Karepovs

Primeiro boletim Correio Cemap, de julho de 1985

Ninguém passa incólume por Vito Letizia. Seu conhecimento, seu rigor e sua erudição são utilizados com o fim, como ele mesmo afirmou, de elaborar uma crítica aos desenvolvimentos – em especial àquele do processo revolucionário russo – que fizeram o movimento operário aportar onde ele se encontra neste momento. Pode-se concordar ou não com as opiniões de Vito Letizia, mas não se pode ignorá-las. É desse modo que se concretiza algo particularmente valorizado por ele ao longo de sua vida: o livre debate de opiniões que pavimenta o caminho da compreensão e da ação.

Esta via é a mesma que, desde a sua fundação, em 1981, o Centro de Documentação do Movimento Operário Mário Pedrosa (Cemap), do qual Vito Letizia foi um dos fundadores, traçou também para sua atuação. Criado ainda no tempo da ditadura que se implantara com o golpe de Estado de 1964, e que findaria seus dias em 1985, o Cemap se deu como tarefa a conservação e a preservação da documentação histórica do movimento operário. Ao longo do tempo seu acervo foi crescendo e a ele foram incorporados os importantes fundos de Mário Pedrosa, Lívio Xavier, Fúlvio Abramo, Victor de Azevedo, Plínio Mello, Miguel Macedo, Cláudio Abramo, Fábio Munhoz, Vito Letizia e outros tantos militantes e simpatizantes da causa dos trabalhadores, bem como de organizações políticas e sociais.

Boletim Correio Cemap nº 2, de agosto de 1985

A incorporação de tais conjuntos documentais ao Cemap se deu sobretudo a partir de 1988, quando então se pôde imaginar a possibilidade da concretização de um Estado democrático de direito a suceder de modo perene o inconstante Brasil de até então. No entanto, hoje, como se sabe, a quadrilha que se assenhoreou do poder após o golpe de Estado de 2016 retrogradou o país a passos largos à instável pinguela para o passado…

Além de conservar e preservar tais conjuntos documentais – o que por si só já seria meritório no Brasil, um país reconhecidamente negligente com o seu passado, em especial com aquele das classes trabalhadoras –, o Cemap também se deu a tarefa de realizar pesquisas e estudos sobre movimentos políticos e sociais contemporâneos, com a edição de publicações e a promoção de cursos e debates sobre os temas relacionados em seu acervo. Tais fins, indubitavelmente, se viram facilitados com a parceria de 28 anos entre o Cemap e o Centro de Documentação e Memória (Cedem) da Unesp, desenvolvida desde 1994. A este esforço se juntou em 2013 o grupo Interludium, criando o Cemap-Interludium – Centro de Estudos do Movimento Operário Mário Pedrosa.

Esse longo caminho do Cemap, que completa 41 anos de existência, deixou ao longo dessas mais de quatro décadas importantes contribuições à preservação e à reflexão sobre o movimento operário e às quais se acrescentam as reflexões mais que oportunas de Vito Letizia, postas à disposição do público em seus livros da série “Diálogos com Vito Letizia”, em sua coletânea de ensaios A grande crise rastejante e agora neste site.


O historiador Dainis Karepovs

Dainis Karepovs é doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP), com pós-doutorado pela Unicamp, e um dos fundadores do Centro de Documentação do Movimento Operário Mário Pedrosa (Cemap). Seu mais novo livro é Pas de politique Mariô! Mário Pedrosa e a política (Ateliê Editorial).

Este artigo, com ligeiras alterações, foi publicado primeiro no livro 1917: uma revolução confiscada, o último da série “Diálogos com Vito Letizia”, lançado em 2017. As imagens do primeiro e do segundo boletins “Correio Cemap”, de 1985, fazem parte do acervo do Cemap. A foto de Dainis é de Ana Clara Karepovs.

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