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O militante

Vito Letizia na casa de Olívia Carolino.

Cida Duran

Quando lemos um texto do Vito, temos a satisfação de estar lendo algo objetivo e claro, tanto com relação às ideias, quanto às palavras muito bem colocadas. Mas o Vito não era um escritor-relâmpago. Seus textos eram a finalização de um enorme esforço para que aqueles que o lessem não tivessem dúvidas sobre o que estava escrevendo.

O quotidiano do Vito, quando as suas atribuições de professor lhe permitiam, poderia ser divido em três períodos.

Pela manhã, lia os jornais diários (Folha e Estadão); revistas (The Economist, Time, Le Monde Diplomatique) ou alguma outra publicação que tivesse uma matéria interessante.

No período da tarde, dedicava-se à leitura de livros sobre o assunto que estava pesquisando ou em que tinha um interesse específico, como no caso da cultura chinesa. E, entre os chineses, o seu assunto preferido: o taoismo. Talvez os filósofos taoistas lhe trouxessem conhecimentos sobre a espécie humana que a cultura ocidental lhe parecesse ser incompleta. E, já de tardezinha, parava para tomar chimarrão.

Sempre conseguiu morar em locais onde se pudesse ver o pôr do sol, mesmo que fosse um pequeno pedaço do entardecer. Era o seu momento de conviver tranquilamente com suas ideias ou até mesmo não pensar em nada especificamente. No período da noite, e este poderia se estender até a madrugada, era quando escrevia. Dizia que era um período menos barulhento e que suas ideias fluíam melhor.

Em seus textos, tanto escritos a mão quanto datilografados, era muito preocupado com o que escrevia. Munido de canetas de várias cores, reescrevia sobre o texto várias vezes, cada uma delas com uma cor diferente que desconhecemos a hierarquia que ele dava a cada uma dessas correções.

É uma pena que com o advento do computador percamos todo esse processo de elaboração de um texto, pois a tecla delete apaga também o histórico de um pensamento.

O Vito tinha uma grande preocupação com o leitor de seus textos. Em primeiro lugar deveria vir a clareza das ideias, fruto de suas inúmeras leituras. Além disso, deveriam ser bem escritos, com um vocabulário que todos entendessem e que não desse margem a qualquer distorção de seu pensamento. É por isso que ele só tornava público um texto quando ele estava “enjoado“ de trabalhar sobre ele.

Segundo a filosofia taoista, o verdadeiro professor, para usar um termo ocidental, é aquele cujos alunos vagamente recordam o nome ou seus traços peculiares, mas lembram perfeitamente o que ele ensinou.

Entretanto, do Vito, além de lembrarmos o nome e sua maneira de ser, somos profundamente reconhecidos por tudo que ele nos ensinou.


Cida Duran, companheira de Vito Letizia, é socióloga. Esta foto de Vito foi tirada em 2011, em um encontro de entrevistas para os livros na casa de Olívia Carolino, e faz parte de seu arquivo pessoal.

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